Longomel
O nome desta aldeia, que se tornou freguesia autónoma da de Ponte de Sor em 1984, terá sofrido várias transformações ao longo dos tempos, podendo encontrar-se escrito, segundo Primo Pedro de Andrade, de diversas maneiras. Este autor presume que a origem do topónimo terá sido “Lagosmil”, devido aos muitos lagos ou pântanos outrora existentes ao longo da Ribeira que banha este território.
É possível que a povoação se localizasse originalmente mais a norte, em território correspondente à atual freguesia de Margem, concelho de Gavião, junto à chamada estrada ariciense ou aritinia, via romana que ligava diretamente Aritium Praetorium (Abrantes) a Abelterium (Alter do Chão), integrada num dos três caminhos Lisboa-Mérida, de acordo com o Itinerário de Antonino Pio. Essa via, conhecida como «estrada dos almocreves», não passava em Ponte de Sor, mas sim a norte da atual cidade, por Longomel e Torre das Vargens. Esta localização de Longomel, mais a norte, ainda se manteria no século XVI, pois, segundo o Numeramento de 1537, esse lugar ficava a uma distância semelhante da vila de Gavião (uma légua) e da de Ponte de Sor (uma légua e dois terços, pelo menos), quando atualmente está a 18 km de Gavião e 9 de Ponte de Sor.
A aldeia de “Lagomel” aparece referida numa carta de D. Afonso IV, datada de 1327, como pertencendo ao concelho de Abrantes e, por isso, à Coroa. O rei comunicava às autoridades abrantinas uma sentença dos seus ouvidores, ordenando-lhes que «metam a aldeia na posse» de um procurador régio. Ainda no século XIV, em particular no ano de 1359, há notícia da instituição de um morgado na «quintã de Lagomel, com todas as herdades, pam, vinho, terras assim rotas como por romper com todos os seus casaes, matas e defezas, senhorios, honra, e Padroado da Igreja», por Gomes Martins, vassalo e valido do rei D. Pedro I. Esta propriedade foi integrada no património da Casa de Bragança em 1422, estando incluída na doação feita pelo Condestável D. Nuno Álvares Pereira a seu neto D. Fernando.
Entretanto Longomel autonomizou-se do concelho de Abrantes, formando com Margem um julgado (circunscrição administrativa equivalente à de concelho até ao século XIX), tendo recebido foral manuelino em 1 de julho de 1518. Em 1527, de acordo com o Numeramento ou cadastro da população mandado elaborar por D. João III, esse julgado era habitado por 23 vizinhos, ou seja, cerca de 90 pessoas. Esta situação mantinha-se em 1665, quando os moradores do julgado de Margem e Longomel requereram ao rei isenção do serviço militar, devido à pobreza do lugar e à sua reduzida população. Informando sobre esta petição, o Ouvidor da Comarca de Vila Viçosa, sob cuja jurisdição se encontrava o referido julgado, dizia que este constava de uma charneca, situada entre as ribeiras de Margem e Longomel, com menos de 30 fogos, sendo as casas de taipa, cortiça e colmo, cultivando-se centeio e algum milho; a terra era, porém, «tão esteril, que nenhuma pessoa de fora se atreveria a morar nella, assim pelas pensões e foros que os moradores pagavam ao serenissimo Estado de Bragança, como pela mizeria da gente, e vivenda; e por esse respeito as molheres e filhos dos hereos do mesmo julgado, erão os que guardavam seu gado, e lhes ajudavam à colheita do pão».
Embora o julgado ou concelho de Margem e Longomel ainda apareça referido em 1755, na Descriçam Corografica do Reyno de Portugal, de António de Oliveira Freire, pouco tempo depois, segundo as Memórias Paroquiais de 1758, aquele já se teria desmembrado, passando Longomel a ser uma aldeia integrada no termo de Ponte de Sor e na freguesia de S. Francisco de Assis dessa vila. Dados arquivísticos sugerem que o concelho de Margem e Longomel já estaria novamente formado no terceiro quartel do século XVIII, mas seria definitivamente extinto por decreto de 6 de novembro de 1836. A freguesia de Longomel só foi criada nos anos de 1980, integrada no concelho de Ponte de Sor, pela Lei n.º 47/84, de 31 de dezembro.
Em termos económicos, desempenhou um papel fundamental na história de Longomel a Ribeira homónima, cuja lezíria constitui um terreno fértil, usado sobretudo na cultura de arroz, a partir do século XIX. De resto, a referência mais antiga à existência da orizicultura em Longomel, e simultaneamente uma das primeiras a nível nacional, data de 1800, afirmando o autor galego José Cornide que, no então concelho de Margem e Longomel, «os produtos ordinários são o centeio, o milho e o arroz nos campos de Longomel banhados pelo Sor».
Bibliografia:
- ANDRADE, Primo Pedro da Conceição Freire de – Cinzas do Passado. Revisão crítica por Ana Isabel Coelho Pires da Silva. Ponte de Sor: Câmara Municipal de Ponte de Sor, 2010.
- PESTANA, Manuel Inácio – O Julgado de Margem e Longomel. Gavião: Câmara Municipal de Gavião, 1996.
Ana Isabel Coelho Silva (Historiadora), abril 2014